A arbitragem não é um mecanismo novo no país. Desde a época do Brasil Império, já havia a previsão normativa da solução de conflitos por meio de um árbitro, isto é, por um terceiro não pertencente à estrutura jurisdicional do Estado, eleito pelas partes, idôneo e com conhecimento específico sobre a matéria a ser decidida.
Porém, a tradição jurídica e social do país — muito afeita à autoridade estatal — sempre tratou a arbitragem com desconfiança e receio, já que o instituto quebra a ótica do monopólio do “estado-juiz” na solução de conflitos. Isso ajuda a explicar o porquê de, mesmo após a edição da Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307/96), no longínquo ano de 1996, o instituto ainda demorou a “pegar” no país.
Sem surpresas, foi sobretudo com o aval de decisões recorrentes das cortes superiores que a arbitragem passou a gozar de segurança jurídica suficiente para permitir sua popularização. Um marco foi a confirmação da constitucionalidade da Lei de Arbitragem, em 2001. Outro exemplo é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que se firmou no sentido de reconhecer que, uma vez escolhida a arbitragem pelas partes, é do próprio árbitro, com primazia sobre o Poder Judiciário, a prerrogativa de deliberar sobre a existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem; ou seja, é dele a palavra final para decidir sobre sua própria competência para julgar o caso. Sem essa garantia, que constitui princípio básico da arbitragem em todo o mundo, a autoridade da decisão arbitral seria sempre questionada no Poder Judiciário, perpetuando o conflito cuja resolução rápida e segura as partes confiaram ao procedimento arbitral.
A inclusão de cláusula compromissória de arbitragem passou, então, a dividir espaço com as cláusulas de eleição de foro judicial nos contratos. As câmaras arbitrais proliferaram e ganharam renome. E, hoje, o Brasil está entre os países que mais utilizam a arbitragem no mundo.
As vantagens são claras e justificam a crescente popularização. O procedimento é substancialmente mais rápido, uma vez que anos de contenda judicial se resumem em alguns meses de arbitragem, cuja sentença é final, sem espaço para cadeias infindáveis de recursos. As partes gozam de ampla autonomia e paridade para definirem regras específicas do procedimento arbitral, incluindo o prazo para o proferimento da sentença e realização de atos processuais diversos. A escolha do(s) árbitro(s) pelas partes — sempre guiada pela imparcialidade garantida pela lei e pelo máximo grau de especialização — permite o julgamento da causa por autoridades no assunto, o que torna a arbitragem especialmente valiosa para causas que envolvam questões muito específicas e técnicas, algo inviável de se exigir de um juiz que é chamado a decidir ampla gama de conflitos. Soma-se ainda o sigilo garantido ao procedimento e ao resultado da arbitragem, se assim quiserem as partes.
Portanto, é possível perceber as claras vantagens que arbitragem possibilita na resolução, por exemplo, de conflitos societários, em que uma decisão rápida e sigilosa pode ser a diferença entre a derrocada definitiva da empresa e a sua sobrevivência. Afinal, nenhuma empresa resiste a embates entre os sócios, sobretudo quando se arrastam em processos judiciais mofados, ou quando a publicidade do conflito potencializa os danos causados à sociedade.
A arbitragem também tem espaço na proteção de toda sorte de negócios e contratos que se aproveitam das vantagens do procedimento e contornam suas limitações, que, sim, existem. Um exemplo é que o valor para instauração da arbitragem é usualmente mais custoso do que para o ingresso de uma ação judicial (embora a redução do tempo do processo minore ou suplante essa diferença). Além disso, o juízo arbitral não possui competência para fazer cumprir suas decisões, de modo que o Poder Judiciário ainda é necessário para compelir pessoas e executar, bloquear e transferir bens.
As limitações da arbitragem, porém, não importam na conclusão de que apenas contratos e negócios de valor muito elevado são dignos da cláusula arbitral. Em realidade, é fundamental uma análise conglobante e especializada, por profissionais habilitados, acerca da adequação do uso da arbitragem, a fim de guiar a decisão dos contratantes, possibilitando, ao final, a proteção necessária para a perpetuação e fruição do negócio.
A arbitragem, enfim, “pegou”, e é mais uma ferramenta à disposição da pacificação social e desenvolvimento econômico.
Por Rodrigo Gomes dos Anjos Lima, advogado graduado pela Ufes, associado ao escritório Oliveira Cardoso Advogados e especialista em Direito Ambiental pela UFPR.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 7 de janeiro de 2023, 17h49
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